quinta-feira, outubro 27, 2005

Depoimentos













Finjo falar da mesma forma usando a mesma formula
Tento ser sentido pra mim e desentender de mim
Palavras publicitárias com teor de nada
Toda essa farsa em lata e toda a produção de mascaras
Mudança de conceito pra manter tudo do mesmo jeito

Oh mundo de voz estéreo e visão digital
Mundo fechado achatando as almas
Nas alcovas dos nobres palácios terrenos
Existem negros nos porões esquecidos
Aos gritos o silencio condenado
No pranto se paga o que foi comprado

Oh deuses de voz feroz e enaltecida
Nas suas vestes brancas tentamos escalar
Pedir, suplicar, rastejar e até não pecar
Tentamos chamar atenção ao que resta de nós
Em vão, em vão é o aguardo já esquecido
Então fingimos novamente sermos os seres obedecidos
E voltamos ao chão aos pés dos mandantes

A grande onda navega a espera do sim ou do não
Com total benevolência eu sou como mil corpos
Todos franzinos, todos, quase mortos
Vagando pequenos olhos pela noite
Pela pequena moldura no fundo do arcabouço
Procurando outras palavras e filtros
Na vontade de ter outra cidade que não essa

O barulho da maquina me diz
Acorda pequeno tolo, desperta-te a tua vida!
Só tens vida escrava com fim de morte submissa
Acordo no mesmo lugar, parado escavo com as mãos
Escravo sangue negro em pele e olhos baixos
Aceita o que lhe é dado!
Pelo mundo que pagou barato por sua derrota

Mas as fabricas não podem parar
Ao som das engrenagens estão todos a dançar
Aos felizes sorrisos e os tristes não vejo
Ninguém vê o que se mantém no escuro trancado
E as fabricas não param, fabricam lâmpadas
Escolhem quem iluminar
No foco da luz habitam olhos pequenos
Os mesmos corpos franzinos de meninos e idosos
Como eles, como eu, resolvem nos chamar atenção
Guinando nosso olhar marejado e covarde
Ao encontro do pouco daquilo que nos permitem ver

Do pouco que vejo e do muito imagino
Semeio minha mente e tento lembrar
Buscar na dormência guiada a primeira vista
A primeira morte do inicio dessa vida
Eram homens, eram fortes, eram nobres
Muito ouro nas mãos e muito vermelho nos olhos
Desceram do cerrado trazendo até nós o descampado
Grandes maquinas amarelas queimando o verde
Torcendo as florestas e campos deixados em cinza
Cor de madeira retorcida, cor de alma corrompida

Relembrando o que disse no inicio desse escrito
Finjo! Fingimos! Já estamos cegos e mortos
Já somos nós as maquinas em caixas
Ombro a ombro esperando o comando
A voz segue o botão aperta e a bomba cai!
E se já não caiu que caiam duas, três, quatro ou cinco mil
Trazendo demovo os caminhos de gelo e o golpe
O primeiro giro da roda e o primeiro fogo
Recobrar a inocência das mãos virgens de ossos curvados

É tudo que lembro a principio e o resto é o que está aqui
Nisso que pisas, nisso que não vês e não queres ter
Eu faço parte, sou culpa sem desculpa!
Faço parte do escuro desse beco e mereço
Sei que mereço o todo desse pouco
O oco desse corpo morto que deixei apodrecer
Deixei me render, deixaram todos também
Mas eu poderia ir diferente mesmo que indo só
O grande problema é que não sobrou ninguém
Pra cumprir a pena!

foto por Sergio Rodrigo

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